O movimento Gnóstico

           Por: Sebastião Catequista.pentagrama_esoterico

O cristianismo nascente enfrentou muitas adversidades em seu caminho. Muitos foram os desafios políticos, sociais, culturais, filosóficos e religiosos. O gnosticismo também foi um desses desafios.

            Segundo alguns estudiosos, o gnosticismo era uma tendência cujas bases tinham elementos das religiões orientais e da mística helênica. O movimento gnóstico era uma reação quase que cultural contra os fundamentos das tradições religiosas pagãs do império, bem como também das tradições religiosas judaicas e cristãs. O chão dessa tendência era a mesma na qual estava o cristianismo contextualizado: o povo vivia numa época de transformações política-militar, ideológica-cultural e social do mundo grego-romano.

            Nesse contexto muitas foram as pessoas convertidas ao cristianismo nascente, e que se deixavam seduzir-se pela onda da hora, e faziam uma leitura da proposta cristã a partir da visão gnóstica.

            Mas, no geral o que caracterizava o pensamento gnóstico? De que modo à comunidade cristã reagiu às suas propostas e ideologias?

            Segundo o escritor Frangiotti no seu livro “História das Heresias” o movimento gnóstico se caracterizava “(…) pelo menosprezo da matéria, da carne e superestimavam a alma-espirito. Para eles, a matéria é má em si mesma, incapaz e desnecessária para a salvação (…). por isso, Deus, o espírito perfeitíssimo, transcendente, imutável e impassível, não pode, por nenhuma razão, assumir qualquer parcela da matéria. Em outras palavras, é impossível conceber a encarnação de Deus na matéria (Frangiotti: 1995, pág. 27).

            Eles se julgavam assim, como atingido um estágio do conhecimento superior, diferenciando-se dos demais cristãos e pessoas comuns. Para os gnósticos só através desse conhecimento superior é que se chegava à salvação. As pessoas deveriam passar por uma iniciação se quisessem atingir esse conhecimento secreto.

            Ao pensar e agir assim, os gnósticos negavam a encarnação de Jesus e o mistério da redenção. Para eles, Jesus corporal, carnal era só aparência. Se Jesus fosse Deus seu corpo real só podia ser astral, celestial, espiritual, e não material, carnal. Dessa forma os gnósticos esvaziavam o conteúdo da fé cristã.

            Sua visão era dualista. Distorcia a realidade, colocava a vida comunitária em perigo, como também os conceitos e as verdades da fé cristã. As comunidades da Ásia Menor e de tradição paulina, bem como as que têm influencias do apóstolo Pedro sofreram no seu cotidiano com essas e outras correntes e situações. Era preciso reagir.

            E os cristãos reagiram duramente e veementemente contra essa forma de pensar, agir e crer. E essa reação vai na linha da tradição apostólica. Abaixo, oferecemos alguns elementos a mais para aprofundamento e leitura dos textos bíblicos cujas linhas estão contextualizadas dentro dessa realidade.

Evangelho de João

            O evangelho de João difere dos demais sinóticos (Mt, Mc e Lc) pela sua composição, conteúdos e pela sua teologia.

            Logo no inicio temos o Prologo e a Semana inaugural da missão de Jesus. Depois, temos os capítulos que configuram o coração do seu escrito: o livro dos sinais (1,19-12,50) e o livro da glória (13,1-20,31).

No livro dos Sinais nos é apresentado sete deles: em Caná a transformação de água em vinho; a cura do filho do funcionário real; o paralítico junto à piscina; a multiplicação dos pães; Jesus caminha nas águas; a cura do cego de nascimento; a ressurreição de Lazaro.

O livro da Glória nos apresenta Jesus nos seus últimos dias e sua doação total ao projeto do Pai. Sua morte, ainda que se configure como derrota, o evangelista nos mostra que é a glória. É preciso que a semente morra para dar frutos. Esse é o seu maior legado: o amor oblativo.

O evangelista termina seu escrito com um epilogo ou apêndice, no capitulo 21.

Para quem ele escreve? Quais os principais desafios?

O autor escreve para as comunidades da Ásia Menor, aí elas enfrentam conflitos com as autoridades religiosas do judaísmo; a marginalização social por ser excluídas das sinagogas; as ideias tanto das filosofias grega e do movimento gnóstico. Nesse contexto, o evangelista mostra a pessoa de Jesus bem humana e encarnada, porém, nos diz que esse Jesus é de origem divina, e por isso mesmo, seu mistério só pode ser desvelado e visto a partir da fé, dos Sinais; e compreender sua Glória a partir da Ressureição.

Ao ler o evangelho de João devemos entrar na dinâmica do evangelista para compreender Jesus e sua mensagem, bem como entender, visualizar o contexto e os conflitos dos quais as comunidades tiveram que enfrentar.

            Evidentemente que os gnósticos foram um dos desafios, e que constitui ainda hoje, um desafio bem maior, haja vista estarmos no mundo moderno globalizado onde a cada minuto aparecem milhares de “ideias” mostrando o “verdadeiro” Jesus. Mas… as comunidades enfrentaram o problema. Senão, vejamos outros textos do Novo Testamento.

Primeira Carta de João:

            João escreve mostrando a verdade da fé cristã contrapondo aos grupos cujos adjetivos encontramos no texto: sedutor, enganador, impostor, anticristos (2,18.22; 4,3; 2Jo 7); profetas da mentira (4,1); mentirosos (2,22); os que são do mundo (4,5); que se deixam guiar pelo espirito do erro (4,6); que estão fora da comunidade (2,19; 2Jo 9) e que pregam uma doutrina que não é de Cristo  (2Jo 10).

            Em que consistia esses erros? Pretendiam ver a Deus (3,6; 3Jo 11), viver em comunhão com ele (2,3), estar na luz (2,9), mas recusavam ver Jesus como Messias (2,22), como filho encarnado (4,2) negando a Jesus como divino humano, humano divino. A essas atitudes, o escritor é enfático em defender a fé cristã.

A carta de Judas

            O autor da carta previne seus leitores contra falsas doutrinas e grupos que de algum modo corrompem a vida e a fé cristã. Suas vidas são marcadas por uma falsa piedade e religiosidade. Mas que ideias, são as atitudes que causam transtornos e divide a comunidade. É contra essa forma de conceber o cristianismo que sua carta é dirigida aos cristãos.

            Muitos desses falsos mestres e suas atitudes estão de algum modo ligado ao movimento gnóstico. Judas se refere ao problema usando a linguagem e a religiosidade popular extra bíblica do seu tempo; que por sua vez está muito presente no cotidiano das pessoas. Ele chama a esses falsos mestres de ímpios (4a); que negam a Jesus como Mestre e Senhor (4b); que são licenciosos (desregrado, libertino, sensual, imoral) e não respeitam a autoridade, nem os bons costumes (8-10). Sobre esses, Judas oferece orientações firmes para a comunidade lhes corrigindo a postura e exortando a perseverar na tradição apostólica (17-25).

Segunda Carta de Pedro

            No capítulo 2 e 3 da Segunda carta de Pedro, temos algumas exortações sobre essa realidade, digo dos gnósticos e falsos mestres/doutores, na vida das comunidades cristãs.

            Pedro exorta a semelhança de Judas o povo cristão sobre a realidade dos falsos mestres, e proclama sobre eles a justiça e a excomunhão (2,4-9;11), a modo dos tempos passados (2,11-17). Diz que os cristãos devem se afastar dessa gente (2,18-22) e cultivar as virtudes próprias de uma vida digna, devota e abençoada por Deus, longe da injustiça e dos ímpios e falsos pregadores que negam a Jesus Cristo (3).

            Há muitos outros textos principalmente da tradição paulina (Ex.: cf. Gl 1,6-10; 2Ts 2, 3-12; 2Cor 11,3-5.13-15s) que aqui não abordamos, pois, entendemos que, o artigo ficaria extenso demais. Sugerimos a você consultar um dicionário bíblico para maior aprofundamento.

De modo geral, o movimento gnóstico sempre foi uma tentação na vida das comunidades cristãs. E sempre foram rechaçados como caminho que desvirtuavam o caminho do evangelho. Porém, sua influencia na história durou muito tempo e por alguns séculos. Hoje, apesar de movimentos da Nova Era refazer esse caminho dentro da modernidade e num planeta globalizado, não tem mais aquela força e nem poder de atração como antes.

            Seja como for, nesse artigo, quisemos trazer alguns elementos de reflexão para ajudar nosso leitor na leitura dos textos bíblicos das cartas católicas e melhor compreender o contexto das mesmas. Boa leitura.

Bibliografia consultada:

Nova Bíblia Pastoral, São Paulo, Paulus, 2014.

Bíblia Sagrada, Tradução da CNBB, Brasília, 2008.

Biblia TEB, Tradução Ecumênica da Bíblia, São Paulo, Loyola,

Novo Testamento Grego Interlinear, São Paulo, Sociedade Bíblica do Brasil, 2004

Nova Bíblia de Jerusalém. São Paulo, Paulus, 2002.

– Frangiotti, Roque. História das Heresias (Século I-VII) – Conflitos Ideologicos dentro do Cristianismo. São Paulo, Paulus, 1995.

1 Comentário

  1. Já se passaram mais de 2000 anos, e as lições que o grande mestre Jesus deixou ainda estão. PODE SER APRENDIDAS. Se não vejamos onde fica o “Não julgueis para não ser julgados”. “Com a vara que medires sereis medidos.” Tentar caracterizar o GNOSTICISMO UNIVERSAL através de um ÚNICO pensamento e como dizer que a Igreja durante a Idade Média e até os dias de hoje SÓ COMETEU ERROS. Senão vejamos Historicamente a Igreja Católica autorizou a escravidão negra, uma vez que toda nação que saiu com esse intento perguntaram ao papa se aquilo era certo, ainda durante o período da idade média A MULHER, sim a mulher a Igreja defendia a tese que as MESMAS NÃO TINHAM ALMA, eram algo assim como umas bonecas. Isso inegavelmente foram erros que a Igreja teve que assumir e pedir desculpas pelos mesmos, alguns ela ainda não pediu. Digo que estas supostas heresias propaladas pelos detratores do Gnosticismo são apenas distorções históricas propositais em sua maioria, apenas para esvaziar o interesse que ele desperta. São supostas porque o cristianismo enquanto religião ainda nem existia, se organizava e aqui falamos dos cristão primitivos que SIM ERAM GNÓSTICOS em sua maioria portanto e extemporâneo falar em heresia sem estudar as diversas vertentes Gnósticas e tirar conclusões apressadas sobre o mesmo a final a VERDADE da qual o Mestre Jesus falava ainda deve ser revelada pelos senhores para a Humanidade.

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