Oração, Meditação, Contemplação

Oração, Meditação, Contemplação

Por: Sebastião Catequista.

Introdução

A vida interior ou vida espiritual é algo que nos envolve a todos. Como cristãos somos levados a pensar que ninguém vive sem que de algum modo não alimente os desejos mais profundos, que não busque para sim compreender o sentido mesmo de sua vida e diante das contradições da mesma, não se questione sobre os porquês que tece o seu destino.

Diante dessa realidade e como seguidores de Jesus acreditamos que é bem aqui que encontramos um “suporte” que nos dá uma direção e nos abre às possibilidades que vão se apresentando para nós no dia a dia. Falamos da oração, da meditação e da contemplação como instrumentos que nos possibilita experienciar a interioridade, a alteridade e o amor cotidiano.

Dessa forma, o texto que tecemos a seguir são informações e reflexões que quer levar o leitor a fazer também desses instrumentos sua experiencia de fé ou aprofundar sua prática dando ainda mais argumentação para realizá-la. Não é um tratado ou um estudo, mas alguns elementos de reflexão que escrevemos sobretudo para os iniciantes que despertaram de algum modo para cultivar com mais afinco sua vida espiritual ou interior.

Evidentemente, partindo do pressuposto da fé, entendemos que a oração, a meditação e a contemplação parte de uma relação entre um Eu e um Tu que termina implicado num Nós. Nesse caso estamos falando da relação entre o ser humano e a divindade, entre o Nada e o Ser, entre o Efêmero e o Eterno. Em linguagem religiosa, estamos falando de Deus Uno e Trino e de Nós seres humanos.

A oração

Segundo o Catecismo da Igreja Católica, parafraseando Santa Teresa D’Ávila, a oração é “a elevação do coração a Deus”. É falar com Deus. Todos nós sabemos disso e não há muito o que explicar e comentar. Elevar o coração significa dizer nos colocar diante de Deus a partir do nosso mais intimo. É expor-se à Ele abertamente tal como somos. Isso supõe certa “dose” de fé! Inclusive a oração alimenta a fé e a fé dá sentido a oração.

E que sentido tem a oração? Segundo santo Agostinho “nosso coração está inquieto até encontrar repouso em Ti [Deus]”. O salmista também exprime de modo intuitivo esse dilema quando diz: “minha alma tem sede de Ti, ó Deus” (cf. Sl 63, 1s) e afirma: “teu amor vale mais que a vida, por isso meus lábios te louva” (cf. Sl 63, 4). Desse modo está claro o sentido da nossa oração: o desejo de Deus. Mas também é verdade que, além do desejo de Deus, oramos pedindo por nossas necessidades seja de ordem afetiva, de segurança, de saúde, de subsistência, até existencial mesmo.

Daí a necessidade de criarmos hábito para orar. Porque assim a oração eleva de certo modo nossa consciência e nos informa de quanto somos precisados de Deus. Com isso, exercitamos a humildade. Deus sabe do que precisamos e não necessita de nossa oração mas justamente para entendermos nossa condição de pessoas humanas, de compreender nossa fragilidade, e saber o nosso lugar e lugar de Deus, é que Ele nos incentivar a orar, porque assim desenvolvemos em nós o temor. Temor não tem nada haver com o medo, mas tem haver com a consciência de qual é o nosso lugar e a nossa condição; e qual é o lugar e a condição de Deus. E isso é muito importante para uma relação entre nós e Deus.

A partir daqui poderíamos nos perguntar: E quais tipos de oração somos levados a fazer quando oramos? Segundo a tradição orante e os ensinamentos da Igreja ao orar podemos fazer dos seguintes modos essa oração: a Adoração – que é basicamente um ato de fé reconhecendo a Deus como Senhor de nossas vidas, afirmando seu Poder enquanto ato de amor por nós. Aliás, para um cristão, é imperativo a oração de adoração. É dever nosso adorar a Deus por sí mesmo e pelo seu amor por nós; a Suplica – enquanto ato de apresentação das nossas necessidades pessoais a Deus; a Ação de Graças – como ato de agradecimento pelo muito que Deus significa e nos dá; a Intercessão – enquanto ato de pedir pelos outros, nossos semelhantes, amigos/as, parentes, necessitados, etc; o Louvor – enquanto ato de bendizer a Deus pelas suas obras e seu amor. Seria um elogio sincero de nossa parte que reconhece a Glória, o Esplendor, a Beleza de Deus em suas criaturas e nos seus atos; a Bênção – oração que indica o ato de abençoar alguém ou pedir para ser abençoado/a.

É claro que toda oração é espontânea uma vez que é diálogo a dois, mas ao mesmo tempo é guiada por um senso de necessidade, não de Deus, mas de nossa necessidade de lhe falar o que no momento sente o nosso ser, o nosso coração.

Ao falar dos tipos orantes, podemos também nos perguntar sobre os gestos na oração. Sim, porque não é só a cabeça que reza, que ora, mas todo nosso ser, e isso é expressado de modo admirável pelo nosso corpo. Daí porque também os gestos fazem parte da oração. E alguns são bem expressivos: Ficar de Pé com mãos erguidas – indica prontidão e disponibilidade diante do Senhor; Sentados – indica escuta, estar atento ao que Ele nos tem a falar ao mesmo tempo que lhe “saboreamos” a presença; Ajoelhados ou Prostrados – indica adoração e entrega profunda e total a Deus, é um ato de temor também. Veja o exemplo de Moisés diante da sarça ardente (cf. Ex 3); Mãos Postas/unidas – indica devoção, concentração, confiança, elevação do nosso pensamento a Deus. Esses e outros gestos nos dá o tom da nossa oração e o quanto estamos recolhidos, absortos na oração, no encontro com o Senhor.

É suficiente orar quando temos vontade? Não. A oração precisa ser cultivada, praticada, exercitada. Ela precisa em nós pegar ritmo, pois não depende só de nossa vontade. Não é algo espontâneo como a fome que chega e pede comida, ou quando o corpo está cansado e pede repouso, ela realmente precisa ser praticada. Rezamos por que temos necessidade da oração. Depender só da vontade e rezar só quado tem vontade é algo muito perigoso, porque nos momentos mais precisados ela não veem a contento. Devemos cultivar o hábito de orar sempre. É o que nos recomenda as Escrituras (cf. Fl 4,4-7; 1Ts 5,16-18).

E como se ora? Essa pergunta parece um tanto descabida mas é pertinente. Existe vários jeitos de orar, rezar. Normalmente rezamos com a boca. É o que se chama de oração vocal. Porque emitimos sons, nossa fala, nosso código linguístico. De outro modo também há a oração mental. Porque rezamos com a mente, exercitamos nossos neurônios para tal, que é diferente de imaginar, pois imaginar está mais no mundo da fantasia, da imagem, enquanto rezar com a mente estar mais no sentido do diálogo real do que imaginativo. Existe também a oração do coração. Essa oração é algo mais complexo. Sua base estar em que, a partir dos outros meios (vocal, mental) se desenvolve através da respiração todo um processo que leva o nosso coração a rezar de modo ininterrupto. É o que acontece por exemplo, com que pratica e tem a experiência de anos com a Oração de Jesus ou Mantra. Um método de oração desenvolvido a mais de mil anos e que tem certa eficácia. Rezar com a boca, ou com a mente ou ainda com o coração/respiração só indica que são parte de algo maior e bem mais profundo: que o nosso Ser ora por inteiro. Porque não somos particionados em pedaços que diz “esse pedaço aqui reza, esse não”. Não existe isso. É todo nosso ser que reza. Apenas tais mecanismos são indicadores que estamos orando, rezando.

E quando devemos orar? Todos os dias, o dia todo! É o que nos orienta as Escrituras, é o que nos ensina a Igreja. Aliás, nesse sentido a Igreja tem uma tradição orante de mais de mil anos em que ela orar sete vezes por dia. Essa oração é conhecida como Ofício Divino e que no Brasil chamamos de Liturgia das Horas. É um livro que contém todo um ritual com salmos e hinos bíblicos e da tradição cristã de séculos. Seria interessante conhecê-lo. Inclusive esse ritual no Brasil foi atualizado e adaptado as realidades de nossas comunidades com um outro livro e ritual conhecido como Ofício Divino das Comunidades. O fato é que, devemos rezar todos os dias e a Igreja insiste muito sobretudo na vida moderna, que os cristãos faça sua oração pela manhã e a noite. É o mínimo dos mínimos, diariamente.

E como se deve orar? Geralmente há as orações comuns da tradição da Igreja: o Pai-nosso, Ave-Maria, Glória ao Pai, Credo, etc, Porém a Igreja recomenda algo mais substancioso, metodológico, algo que nos leve a criar ritmo, hábito e passe mais tempo em oração. Nesse sentido a Igreja incentiva a Oração dos Salmos; é importante rezar com a Bíblia, fazer dela nosso manual de oração; outro meio é a Léctio Dívina ou Leitura Orante da Bíblia que é um jeito de ler rezando trechos da Bíblia e que é uma tradição milenar na Igreja; Também há o Rosário de Nossa Senhora como é conhecido popularmente; o Terço da Divina Misericórdia; a Mantra, etc. Todos esses meios e outros mais (novena, via-sacra) são bons e nos ajudam a criar hábito, a cultivar nossa vida interior.

Por fim: Quais os efeitos da oração? Essa pergunta é séria e sua resposta é muito relativa. Mas no geral se pode dizer o seguinte: Geralmente que tem o hábito de rezar e estar experimentado nesse arte, diz que seus efeitos produz uma calma, uma tranquilidade e uma lucidez muito grande. Normalmente que ora de algum modo sempre sai transformado dessa oração. Há quem está aflito e fica consolado; há quem esteja desanimado e sai revigorado; quem estar sem esperança encontra forças; quem estar sem luz encontra mil e uma possibilidades; quem estar vazio sai cheio da presença. Talvez o efeito mais significativo seja o fato de que na oração acontece um verdadeiro encontro com Deus e saímos de algum modo transformados. E isso é atestado por todas as pessoas que rezam, sobretudo por quelas que mantém um hábito diário.

Meditação

Meditação é o ato de pensar, refletir, ponderar, analisar. Mas também é simplesmente estar consciente, presente.

Geralmente através da meditação procuramos os “porquês” da vida, uma intuição, uma resposta que nos ilumine perante a vida.

E existe um método para meditar? A resposta a esse pergunta é sim. Um não, vários métodos, porque ela é tão diversa quantos mestres espirituais existem por ai. São tantos e tantas. Há métodos de meditação que dão enfases a expressões corporais e todo um malabarismo com o corpo; há outros que enfatizam mais a concentração da mente; e há outros que usam mais a lógica, o raciocínio; e há outros que usam mais a respiração, etc. No geral todos têm em comum o ato de pensar, de elaborar ideias, pensamentos.

Devemos lembrar que o método não é um fim em si mesmo mas deve nos guiar para uma outra realidade.

Diante do hábito da oração diária e do cultivo da vida interior é preciso que usemos a meditação. Que aprendamos a meditar e meditar todos os dia.

E a meditação não é imaginação, mas também prescinde dela como também do desejo e da emoção. Porém não deve ficar nisso, seu objetivo é chegar a um fim, senão, qual seria sua “serventia”?

Meditar deve ser um exercício frequente entre nós. E o conteúdo da meditação é a vida. Para nós cristão a vida a partir da pessoa e da pratica dos ensinos de Jesus. Através da meditação compreendemos melhor a vontade de Deus para nós e para o seu povo.

Também a meditação além de exercitar o pensamento é simplesmente estar presente. Está ali. Isto é ficar quieto, imóvel, parado. Estar consciente do momento presente e nele permanecer. Esse tipo de meditação é mais complexo, exigente, requer algum esforço de nossa parte.

E quais benefícios da meditação? Na maioria das vezes temos uma sensação de bem-estar, de tranquilidade, de lucidez, de coerência. Mas, seu grande efeito seja este: nos permitir estar cara a cara, frente a frente conosco mesmo e por sua vez nos predispor diante de Deus. Através da meditação tomamos consciência de nós mesmos e do grande mistério e sua presença que é a presença de Deus aqui e agora perto de nós, se relacionando conosco. Esse é o “ganho” da pratica da meditação. E aliada a oração é um excelente meio de alimentação da nossa vida espiritual.

Contemplação

Contemplação é o ato de “prestar atenção” com mais sensibilidade, com encantamento, é estar tomado por algo.

A contemplação não tem nada haver com “serventia” com a “utilidade” porque sua lógica não é de “coisificação” e nem de “serve para isso ou para aquilo” mas, sua função é de outra ordem. Ela estar mais para o sentir, enxergar, se dá contar de, experimentar… a utilidade da contemplação é nos aproximar do mistério, de enxergar a essência, a beleza que nos encanta e seduz, é o de perceber o sentido que coisas, pessoas, acontecimentos tem em si.

Quando contemplamos algo nos apercebemos de certo modo parte desse algo. Percebemos que de algum modo tudo e todos estão interligados. Ainda mais quando nossa contemplação nos remete a Deus.

Exemplo: quando estamos numa praça e de repente vemos uma flor que nos chamou atenção e por alguns instantes lhe dedicamos nossa olhar e atenção; ou mesmo quando vemos o pôr do sol, ou vemos um quadro de uma artista, ou ainda contemplamos uma cena bíblica e aí nos deixamos absorver por ela, acontece nesse momento o ato da contemplação.

A contemplação mesmo em algumas vezes acontecendo espontaneamente em nós pela ocasião de algum objeto que nos tenham chamado a atenção repentinamente, ela não é algo que corriqueiramente assim aconteça, é preciso praticar. Contemplação também se aprende, também se pratica.

E diferentemente da meditação que exige de nós certo trabalho de raciocínio, onde usamos muito a concentração e a mente, a contemplação pelo contrário, é algo mais ligado as nossas faculdades sensitivas. Ela nos faz enxergar, olhar, sentir, perceber, se encantar, e vai muito além do pensamento.

E o que é contemplar a Palavra de Deus? Literalmente é enxergar Deus através dos meios, fatos, pessoas, acontecimentos que nos remete à Ele. Diferentemente da meditação que “pergunta e pensa” sobre Deus; a contemplação não pergunta, ela “enxerga” por assim dizer, a Deus.

Enxergar a Deus pode ser entendido de modo literal ou metaforicamente, mas que de algum modo há uma experiência real onde acontece a contemplação.

Conclusão

A oração, a meditação e a contemplação são meios pelos quais temos “contato” com Deus, alimentamos nossa vida espiritual, nossa vida interior e nossa fé. É preciso aprender a praticá-las com grande proveito. É claro que não se aprende fazendo uma vez aqui outra a li, esse aprendizado é um exercício constante, requer de nossa parte assiduidade.

Com o tempo vamos nos acostumando e percebendo os ganhos que vamos adquirido com essa forma de lhe dá com a nossa espiritualidade.

Bibliografia pesquisada

– Jerusalém. Bíblia de. São Paulo: Paulus, 2016

– Eu Creio. Pequeno Catecismo Católico. Espanha: Verbo Divino, 2009

– Youcat Brasil. São Paulo: Paulus, 2013

– Betto. Frei. Fé e afeto – espiritualidade em tempos de crise. Petrópolis: Vozes, 2019.

– Merton. Thomas. Direção Espiritual e Meditação. Petrópolis: Vozes, 1962.

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