Por: Sebastião Catequista.
O mistério da Encarnação: Deus se tornou humano assumindo nossa pobreza.
“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós e nós vimos a sua glória.” (cf. Jô 1,14a) Eis o grande testemunho incontestável da fé cristã. Deus, a suprema divindade, se esvazia de Si, deixa o seu “habitat” e assume a condição finita e humana para está conosco. Porque o fez e que conseqüências sobreveio à natureza de toda a criação?
Porque o fez é um mistério que só se alcança com a fé ainda que não de todo esclarecido; as conseqüências estão na história e no cotidiano de nossas vidas e no desenrolar da mesma, onde o amor divino se coloca diante dos nossos olhos fazendo nos render as evidencias dessa presença e encarnação do divino no humano. Eis o mistério da Revelação.
Esse Mistério (Deus que se revela e que assume a condição humana) o celebramos nas comunidades cristãs dia-após-dia com a sagrada Liturgia, e o contemplamos vivamente através de nossas devoções e ações pastorais.
Um mistério tão profundo assim (Deus que se revela e que se fez humano) só é possível captar e compreender com a fé à luz da razão; e de outra forma entende-lhes o significado a partir do pobre. Porque o pobre por assim dizer, analogicamente, é a carne exposta daquilo que é genuinamente o ser humano em sua realidade real e atual e justifica o ato mais profundo de amor de Deus amante: a divina Encarnação. É a partir da ótica do pobre e de sua pobreza que conseguimos captar em parte, e compreender de modo inequívoco o agir de Deus; e o comover de sua Compaixão pela criatura amada.
Eis outra faceta do mistério da Encarnação que foge a lógica mundana e ideológica da própria fé. Para encontrar, contemplar e estabelecer relações com Deus, entre muitas outras formas e meios (ex.; a religião) o pobre, também é um canal. Entretanto, o pobre não é o “X” da questão, mas Deus mesmo, porque sendo Deus assumiu de nossa pobreza humana e por meio dela nos enriquece com seus dons.
É a partir da realidade de nossa pobreza e da nossa condicionalidade limítrofe que podemos manter um relacionamento recíproco com Deus através de nossos semelhantes e compreender o seu agir que mesmo em sua suprema divindade é sumamente humano.
O desdobramento desse mistério revelado: Deus conosco, humano como nós, é visivelmente celebrado na cultura ocidental através do natal e na liturgia através das demais festividades, sobretudo das solenidades do natal, da epifânia e do batismo do Senhor, neste tempo. Cada qual com sua particularidade nos mostram quão verdadeira e humana é a encarnação de Deus, bem como tão divina é sua natureza.
Deus está no meio de nós, se comunica conosco, nos ama, é amigo e companheiro. O encontramos através de muitos modos e meios, um deles é o pobre.
Nas periferias há uma Belém, ela nos aguarda para um encontro inesquecível. Nela o natal não é 25 de dezembro, mas todos os dias. Deus é Conosco. Eis o mais profundo significado do Mistério da Encarnação. Eis o elemento primordial que funda nas culturas o Natal.
Natal: o sol da justiça veio nos visitar
A história do natal é complexa e de certo modo e ponto de vista problemática.
O natal como conhecemos hoje, tem uma tradição de mais de dois mil anos e a cada época e lugar lhe é acrescentado elementos culturais novos. Entretanto, sua origem advêm da cultura romana dos primeiros séculos do cristianismo que o assumiu como expressão folclórica do nascimento de Jesus, Deus Conosco.
É verdade que não sabemos exatamente todas as informações que permitam aos cristãos datar mês, ano e local exato do nascimento de Jesus, contudo, isso nunca foi um problema para as comunidades primitivas celebrar o mistério da encarnação do Senhor. Prova disso são os relatos dos evangelhos, que mais do que dá informações precisas, quer que compreendamos a verdade revelada por trás dos fatos narrados.
Por isso podemos afirmar que sempre foi celebrado de forma própria nas comunidades cristãs o nascimento de Jesus, de modo que o natal como o conhecemos hoje salvo algumas variações de elementos culturais antigos e modernos é fruto da inculturação da vida cristã na cultura romana ou vice versa. Vejamos o que nos diz a teologa e liturga Ione Buyst.
“Por que, então, o 25 de dezembro? Há uma outra explicação mas aceita. É que naquela data festejava-se em Roma a festa do “Nascimento do Sol invicto”. Ou, em latim: Natale Solis invicti. O sol acabava de passar pelo ponto mais afastado do equador, quando as noites são mais longas. As noites ficando mais curtas e os dias mais longos, dava a impressão de que o sol “renascia”. O sol não morre nunca: ele é invicto, invencível; a noite e as trevas não podem acabar com ele. Daí, então, o nome da festa: nascimento do sol invicto. O sol representava uma divindade na crença dos romanos. Por isso, a festa do Natal era uma festa religiosa (…) Como é que esta festa pode estar na origem do Natal cristão? Há duas suposições. Talvez se tenha criado uma festa cristã no dia da festa pagã, querendo combater o paganismo: afinal, o único Sol, a única luz invicta é Jesus Cristo. Ou, então, os cristãos aceitaram a festa como tal, cristianizando-a. De qualquer modo, houve uma aproximação entre a festa pagã que celebrava a vitoria da luz sobre as trevas, do dia sobre a noite, e o simbolismo bíblico de Cristo como luz do mundo.” ( Buyst. Ione. Preparando Advento e Natal / Equipe de Liturgia 2. Petrópolis. Vozes. 1985. pág. 46)
Eis algo importante que nos ajuda compreender a cultura do natal. Esse natal que temos hoje ai e que serve à exploração comercial, que infantiliza adultos, que falseia a verdadeira mensagem e a verdade da Encarnação. Hoje temos um natal pagão com o características e nomes cristãos, que celebra o velho Noel em vez de Jesus, alias, Jesus, esse Jesus natalino é um ídolo e uma falsificação do Jesus real, presença de Deus entre os homens e que lhe tem para cada um/uma palavras de conversão, amor, compromisso e salvação, mas que também se mostra o contrário.
Convém, pois, estarmos atentos ao celebramos o natal do Senhor. Datas e rituais são simbólicos, mas seu conteúdo é dado de fé, fé que nos remete ao encontro com esse mesmo Homem-Deus e Deus-Homem que nas ruas, vielas e estradas da Galiléia nos convida a conversão como ato de amor a Deus e ao Reino que com ele vem para os bem-aventurados.
Celebremos, pois o natal, o verdadeiro natal que é encontro com o grande mistério da Revelação: Deus encarnado por amor de nós outros. E nos rendamos a Deus em culto de adoração e vida, de modo especial a partir do pobre, pois é na periferia de Belém quem ele nasceu, e foi aos pobres que primeiro revelou seu plano de amor: Glória a Deus… Paz na Terra aos homens de boa vontade.
Bibliografia consultada:
- Buyst. Ione. Preparando Advento e Natal / Equipe de Liturgia 2. Petrópolis. Vozes. 1985.
- Freitas. Pe.Jose Campos. Liturgia serviço do povo e para o povo de Deus. São Paulo: Paulinas, 1990.
- Madruga. Joaquin. Celebrar a salvação. Iniciação à liturgia. São Paulo: Paulus. 1999.
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