Os irmãos de Jesus

irmaos-de-jesus            Jesus teve irmãos? O que nos diz os textos bíblicos? Como o entenderam a tradição eclesial posterior?

            No Novo Testamento a palavra “irmãos” tanto tem conotação com “parentesco” consanguíneo; como conotação “social” ligado a clã, tribo, nação. E Jesus mesmo estende o substantivo irmão para o grupo de seus seguidores, dando a entender que são irmãos de “ideal de vida”. Assim, por exemplo, os cristãos são chamados de irmãos cerca de cento e sessenta vezes em todo o Novo Testamento.

            Mas, no que se refere a família consanguínea de Jesus, ele teve irmãos? Os textos bíblicos fazem entender que sim. Mas, sem muitas explicações, de modo que as informações são muito vagas e não consegue responder algumas perguntas importantes para elucidar a questão. De qualquer modo o tema está em aberto.

            E quais os textos e o que eles dizem?

            Marcos 3,20-21 está claro que Jesus tinha família e que estes se preocuparam com ele pensando “enlouqueceu”, o texto não menciona nominalmente quem são seus familiares e grau de parentesco; também em Jo 7,2- 11 há um diálogo entre Jesus e os seus irmãos onde eles têm um conceito errôneo sobre Jesus, de modo que não creem nele. E o texto é muito enfático nesse sentido. Há uma “crise” familiar sobre sua pessoa. E a palavra irmãos aparece nesse texto, mas é muito vaga para se ter uma precisão mais clara quanto ao grau de parentesco.

Em Marcos 6, 1-6 [destaque especial para o versículo 3] Jesus volta para sua pátria e para casa da família. Na sinagoga o povo se espanta de que tenha tanta sabedoria de forma que o texto nos dá duas informações preciosas sobre ele: é carpinteiro filho de Maria; e os nomes de seus irmãos: Tiago, José, Judas e Simão. E acrescenta uma terceira informação: suas irmãs.

No versículo 3 (cf. Mc 6,3) nos chama a atenção o fato de o evangelista se reportar a Jesus como “filho de Maria” e não como “filho de José” como faz Lucas 4,22b. E Mateus 13, 55 que diz “não é ele o filho do carpinteiro”. Coisa que segundo a tradição judaica não é comum. Geralmente o filho é mencionado ligado ao pai e não a mãe (cf. também Jo 6,42). Os especialistas veem nesse detalhe entre outras coisas, a afirmação de que “ele é o único filho de Maria”, e isso não excluir os “outros irmãos” mencionados no texto de serem “filhos adotivos” de Maria, através de um outro casamento de José. Mas essa informação não consta em nenhum lugar no texto e nem na Bíblia. Sabemos apenas pela tradição apócrifa posterior conservada pela Igreja. E tem mais, o fato de o texto mencionar ser “carpinteiro” está implícito o ser “filho de José” nesse mesmo verso.

 No episódio de Caná (2,11-12) João menciona Jesus com Maria sua mãe juntamente com seus discípulos e os irmãos: “Depois disso, desceram a Cafarnaum, ele, sua mãe, seus irmãos e seus discípulos, e ali ficaram apenas alguns dias. ” (cf. Jo 2,12). E no outro episódio da paixão a coloca juntamente com uma outra irmã, as mulheres que o seguia e o discípulo amado aos pés da cruz: “ Perto da cruz de Jesus, permaneciam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena” (cf. Jo,19,25). Já nos evangelhos sinóticos (Mt, Mc e Lc) Maria mãe de Jesus está ausente com os seus familiares consanguíneos (cf. Mac 15, 40-41; Mt 27,55-56; Lc 23,49) desse episódio da paixão.

Segundo opinião de todos os especialistas e estudos sérios recentes da teologia sobretudo católica, a perícope de João quando do relato da paixão não reflete tanto o dado histórico, mas o dado teológico pós-pascal quando Maria mãe de Jesus assume aos olhos da fé cristã novo significado sobretudo nas comunidades joanina (G. Barbaglio). Do mesmo modo que a “irmã” de Maria nesse texto pode significar “uma parenta” próxima ou uma “construção teológica” se referindo não a uma parente consanguínea, mas, no sentido de “uma seguidora” de Jesus (cf. Mc 3,35), como as demais mulheres.

Após a ressurreição, em Jo 20,17 está escrito o seguinte: “Jesus lhe diz: “não me toques, pois ainda não subi ao Pai. Vai, porém, a meus irmãos e dize-lhe: Subo a meu Pai e vosso Pai, a meu Deus e vosso Deus. ” O evangelista utiliza a palavra irmãos se referindo aos discípulos como fica claro no verso seguinte.

Nos Atos dos Apóstolos 1,12-14 [destaque para o verso 14) Maria, os discípulos e os irmãos de Jesus estão presentes no cenáculo após os eventos da paixão e ressurreição do Senhor. Chama atenção o fato do evangelista sublinhar a presença dos irmãos: “Todos estes, unânimes perseveravam na oração com algumas mulheres, entre as quais Maria, a mãe de Jesus, e com seus irmãos. ” Cf. (At 1,14). Como podemos ver diferente de Jo 20,17, aqui, está claro a presença dos familiares (parentesco de que grau?) de Jesus juntamente com discípulos e discípulas.

            Nas cartas paulinas, Paulo se refere aos “irmãos do Senhor”. Em 1Cor 9,5 falando em sua defesa, ele dá um exemplo afirmando: “Não temos o direito de levar conosco, nas viagens, uma esposa cristã, como os outros apóstolos e os irmãos do Senhor e Cefas? ”.  No texto de Gálatas 1,15-24 [destaque para o versículo 19) ele menciona a “Tiago, o irmão do Senhor” quando de sua visita a Igreja mãe em Jerusalém: “Não vi nenhum apóstolo, mas somente Tiago, o irmão do Senhor” (Cf. Gal 1,19). É interessante ler Gálatas 2 onde o texto na visão de Paulo fala de sua estadia na assembleia de Jerusalém (cf. Atos 15) e aqui nessa perícope aparecem as colunas da Igreja, Pedro, Tiago e João.

            Aliás, falando de Tiago, todos os textos bíblicos, são uma unanimidade (e os especialistas da atualidade concordam) que Tiago, irmão do Senhor, é uma autoridade, figura importante na Igreja primitiva; e que não há motivos porque duvidar de seu parentesco com Jesus.

            A Igreja em sua Liturgia atual (3 de maio) celebra a festa de são Tiago Menor (irmão do Senhor). Dele, se diz que foi filho de Alfeu (cf. Mt 10,3).

            Sem querer se estender muito, como podemos ver, os dados são frágeis para uma afirmação contundente, porém como falamos acima, o substantivo “irmão” tem variado significado e a plausibilidade de que Jesus tenha tido irmãos é uma possibilidade, apesar de muitas perguntas de ordem teológica e doutrinal se impor contra. Contudo, o que se coloca para reflexão não é tanto o dado teológico-doutrinal, mas o histórico e da tradição, e quanto a isso, parece que Igreja e especialistas não tem respostas objetiva, a não ser o dado cultural ligado a palavra “primo” para interpretar a palavra “irmão” no que se refere a parentesco. Então, esse dado encerra e melhor esclarece a questão. Mas que não diz tudo. De modo que o tema é “escorregadio” uma “casca de bananas” no dito popular.

            Para você leitor, deixo a conclusão. Mas, seja qual for sua conclusão, é importante considerar os dados bíblicos e a tradição eclesial.

Obras consultadas:

*  Biblia de Jerusalém, São Paulo-SP, Paulus 2016.

* Nova Biblia Pastoral. São Paulo-OS, Paulus 2015

* Aslan, Reza. Zelota: a vida e a época de Jesus de Nazaré. Rio de Janeiro-RJ. Zahar, 2013.

* Theissen, Gerd. Merz, Annette. O Jesus histórico – um manual. São Paulo-SP. Loyola, 2004.

* Barbaglio, Giuseppe. Jesus, hebreu da Galileia. São Paulo-SP. Paulinas, 2012

 

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