Ecumenismo: elementos para reflexão

Por: Sebastião Catequista.

imagem da internet

I. Introdução

No século XI (1.054) a Igreja do Ocidente se separou da Igreja do Oriente. Motivos de ordem político teológico e cultural os levou a isso. Houve algumas tentativas de diálogo que se tornou infrutífero. Mais tarde no século XVI (1.517) houve as controvérsias em torno da doutrina da justificação e indulgencias dentro da Igreja Ocidental dando origem a uma nova divisão, o Protestantismo. É dessa nova divisão que nascem novas expressões do Cristianismo: Luteranos, Anglicanos, Batistas, Presbiterianos, Metodistas, Episcopalianos, etc. Ao longo do tempo também no Protestantismo muitas outras expressões, foram surgindo. No início do século XX (1.918) surge por exemplo, o movimento Pentecostal que deixará sua marca tanto nas Igrejas protestantes tradicional quanto no catolicismo. Igrejas como Assembleia de Deus, Deus é Amor, Universal do Reino de Deus, deixaram suas marcas na cultura religiosa no meio do povo, sobretudo do Brasil.

Mas, porque aconteceram essas divisões que deram origens a essas Igrejas dentro do Cristianismo ocidental? Responder a essas perguntas supõe conhecer a história e se deve a vários fatores e momentos político-religioso na História. Uma resposta simples e factual pode servir a muitos argumentos e grupos, mas corre o perigo de cair também em erros e intolerância. E não é o que ocorre por aí dentro de nossas igrejas?

Partindo de uma leitura teológica convencional, a Igreja nasceu de Cristo1. Jesus antes de sua paixão rezou pela unidade dos discípulos e pelos que viriam depois deles, pedindo que não caíssem na tentação de “ser do mundo” e “que todos sejam um” em seu nome (Jo 17). Essa oração sempre foi interpretada na linha da unidade da Igreja Católica Ocidental. Naturalmente não havia e nem se cogitava que um dia a Igreja Ocidental teria diferentes formas da igreja romana. Havia uma exclusividade. Nem as Igrejas Orientais aí cabia.

Por sua vez, desde seu aparecimento na História, os protestantes naturalmente nunca se colocaram diante da questão até que ela tenha aparecido no território da missão. É com os Protestantes ingleses no final do século XIX que se impõe o dilema: Se somos a Igreja de Jesus portadora da Salvação (Evangelho) como justificar nossas divisões interna? Quem está certa? Que salvação é essa que em vez de nos unir nos divide? Questionados pelos seus ouvintes sobre sua divisão a Igreja se viu numa encruzilhada: fazer acontecer a unidade em vista e por causa da credibilidade da pregação. Perceberam que, para seus ouvintes, a divisão soava-lhes um escandá-lo de grande proporção, interferindo até mesmo na veracidade de sua Mensagem.

Dessa constatação nasce o movimento ecumênico na Inglaterra no final do século XIX. É a resposta para a divisão.

O Movimento se espalhou por quase todas as igrejas do mundo. Em algumas décadas seus frutos puderam ser apreciados com a criação do CMI – Conselho Mundial das Igrejas, no qual tem mais de 300 igrejas membros, e entre os quais a ICAR participa como membro convidada; os Conselhos Nacionais que no Brasil é o CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs; bem como diversas ações.

Muitos desses organismos tem como finalidade criar um espírito ecumênico entre os mais variados seguimentos cristãos, como também ser uma presença equilibrada na sociedade. Sua atuação vai desde a área da teologia; dos direitos humanos e atividades que diz respeito à defesa da Vida, principalmente dos pobres; até momentos e decisões importantes que afetam uma postura cristã diante dos questionamentos sociais atuais.

A Igreja Católica Romana (ICAR) apesar de chegar muito tarde, também deu passos no espírito do ecumenismo, graças ao bom e santo papa João XXIII e o Concílio Vaticano II. Passos como a criação do Secretariado para a União dos Cristãos; participação na realização da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos; participação nos Conselhos a nível local, nacional e internacional. Também deu passos no diálogo com vários outras Igrejas sobretudo Ortodoxa e Luterana e tem procurado nas comunidades despertar no seus fieis esse espirito. Infelizmente ainda são poucos sobretudo do clero, que despertou para esse espirito genuíno e pouco ou quase nada se faz de modo mais incisivo. Entretanto, persiste na Igreja, pelo menos a nível institucional e nos documentos oficiais uma tolerância e uma abertura para o diálogo. É o caso das atitudes dos últimos três papas e agora mais fortemente, a postura do papa Francisco com sua lucidez e ações proféticas.

Daí porque nessas poucas linhas abrirmos o espaço para essa reflexão. E de modo claro: em que consiste o ecumenismo? Como podemos vivenciá-lo em nossas práticas eclesiais cotidianas? É o que aqui aludimos nessas poucas linhas de “aperitivo” sobre o tema.

2. Ecumenismo: unidade na diversidade

O que é ecumenismo? Essa palavra têm significado amplo mas sua raiz grega nos diz que: oikos, significa casa, lugar onde se vive, espaço onde se desenvolve a vida domestica, onde as pessoas tem um mínimo de bem-estar. Oikouméne se refere “ao mundo habitado”. Em sentido religioso diz respeito a universalidade do cristianismo. Ele com suas mais diferentes expressões estar em todo mundo habitado. E pensado assim o ecumenismo não constitui um “movimento” no primeiro momento como uma pastoral na ICAR ou mesmo uma “instituição protestante” qualquer, mas pelo contrário, o ecumenismo pode ser compreendido como um “espirito”, uma “postura” uma “atitude” de cada cristão e de cada “instituição/organização” eclesial que diante do dilema da divisão e da uniformidade é provocado a tomar uma postura e atitude evangélica, pois sabe que o que está em jogo não é essa ou aquela igreja/instituição, mas a credibilidade da mensagem de Jesus.

Agora, é verdade que o “fato/ideia” que gerou o “ecumenismo” dentro do processo histórico natural gerou também o movimento que criou “instituições” que se tornaram “instrumentos” portadores e fermentadores de novas práticas ecumênicas dentro e fora das atuais igrejas e grupos confessionais.

Desse modo, na atualidade, ao falar de ecumenismo tenhamos bem presente estas duas realidades: ecumenismo enquanto uma postura pessoal e coletiva como também o mesmo se referindo a instituições que representa a ideia conjugando esforços de unidade e bem comum entre as igrejas e mesmo até com e na sociedade.

E aprofundando um pouco mais a noção de ecumenismo tendo como pressuposto a unidade enquanto uniformidade ou que a ela faça referencia ainda que sutilmente, no Cebi encontramos a seguinte proposta de ecumenismo: “Nós podemos ser unidos, mesmo sendo diferentes… os costumes e as tradições que cada pessoa ou igreja tem e que promovem a vida podem ser diferentes. Ser diferente, então, não é a mesma coisa que ser contrário. Nós podemos ser diferentes e mesmo assim podemos nos unir em torno de uma causa, que é a causa do evangelho: a vida plena para todas as pessoas. Ecumenismo… tem haver com uma grande casa, onde todas as pessoas tem direito de viver. A vida dentro de uma casa só tem graça quando existe compreensão, diálogo, harmonia, alegria. Vamos imaginar o mundo como uma grande casa. Nessa casa pode ter o quarto dos católico, o quarto dos luteranos, o quarto dos metodista, dos anglicanos, dos batistas, dos pentecostais e tantos outros. Mas a casa é uma só. Para que aconteça o ecumenismo, não podemos ficar trancados no próprio quarto. É preciso que a gente se encontre na cozinha, na sala, ou no quarto do outro. O importante é saber que estamos na mesma casa e precisamos nos unir para manter a casa bonita e habitável para todas as pessoas.2

Assim podemos entender o que é ecumenismo e perceber que não é uniformidade como muitos entendem e querem que seja. Unidade e Ecumenismo tem outra conotação e olhares diferentes.

Sobre a unidade na diversidade nos ajuda essa reflexão do Cebi: “Que monotonia se as flores fossem todas da mesma cor e tivesse todas o mesmo cheiro! A beleza da natureza é variedade quase infinita (como estamos perto de Deus!) de seres diferentes. Toda sinfonia musical tira sua harmonia das muitas notas, ritmos e sons. A UNIDADE é bonita, não pela uniformidade, mas pela variedade. Em Deus também é assim: a unidade não é uniformidade ou solidão, mas comunhão solidária da variedade de relações na Trindade. Um só em expressões diferentes!3

Ser ecumênico é cada qual assumir sua Identidade confessional sem se fechar em si mesmo e estar aberto as riquezas e experiências um dos outros, assumindo juntos aquilo que é comum em defesa da Vida e da credibilidade do Evangelho.

3. Passos para o Ecumenismo

O ecumenismo deve ser luta permanente dos cristãos para erradicar essa chaga vergonhosa que é a divisão aberta no peito de Cristo – a Igreja. Todo batizado pertence a Igreja de Jesus, é filho de Deus e herdeiro do céu, irmão dos demais batizados. A divisão é um escândalo para o mundo e vai contra a vontade de Deus. Quem não trabalha pela unidade peca. O movimento ecumênico é uma Obra do Espírito Santo. Ecumenismo é conversão, mudança, renuncia. Cristo não é a Igreja e sim sua Cabeça, portanto, se todas as Igrejas são de Cristo elas vão se encontrar no mesmo Cristo. O ecumenismo não deve ser assunto somente para padres ou pastores. Deve ser uma conquista dos grupos de leigos, do povo. Se não fomos ecumênicos não somos cristãos.

O ecumenismo deve ser assunto de catequese, da escola dominical, do culto infantil, no dia a dia das várias igrejas cristãs. Isto requer paciência, humildade, cultivar relações de amizade, de dialogo. No dizer de um grande trabalhador nesse movimento: “precisamos investir no ecumenismo, reeducar nossas praticas religiosas. No meio católico, investir mais no encontro, na fraternidade com os mãos evangélicos. Viver esse amor a Maria sem ser ofensivo a eles. Temos que investir na relação interpessoal. Os evangélicos em sua grande massa se sentem marginalizados por serem minoria e por isso certos preconceitos e discussões, os católicos tem que ter um pouco mais de paciência. Esta é uma engenharia que requer tempo.4

Nessa caminhada há muitos irmãos e Igrejas: Igreja Católica Romana, Luterana, Anglicanos, Metodistas, Presbiteriana Unida, Igreja Cristã Reformada e Ortodoxa… Pouco a pouco outros vão entrando nesse barco. Exemplo disso foi a Campanha da Fraternidade do ano 2000 que foi ecumênica. E o Cebi tem vários exemplares publicados que tem refletido essa temática ajudando as pessoas e grupos quanto a questão do ecumenismo.

Precisamos nos reeducar a partir de nossa fé a reler essa realidade com novo olhar. E isso se dá em passos lentos, mas precisamos começar. Precisamos tomar consciência, depois conhecer mais esse assunto e interagir com as pessoas e realidades com bom senso, convicção e conversão. Aos poucos o Espírito nos vai orientando…

4. Partilhando impressões

A partir destas poucas linhas de reflexão e informação aqui apresentadas que tal refazer nossa memoria histórica de contato com essas diferentes realidades eclesial?

1. Procure reconstituir, sua história eclesial: como aconteceu seu encontro com a sua tradição religiosa?Que tal lembrar fatos, pessoas, imagens e acontecimentos que ficaram na memória

2. Como se deu seu contato com outras tradições religiosas? O que impactou? O que chamou atenção? Quais diferenças e possíveis conflitos experimentados? Como os superou?

3. Conto estou hoje? Qual o meu pensamento e inquietações?

4. Neste assunto do ecumenismo, o e que me incomoda? Em que ele me liberta e me alegra?

5. Conclusão

Para conclusão que tal essa parábola?

E contou-lhes esta parábola: O Reino de Deus é semelhante a um boteco de beira de estrada no interior do Brasil. Um dia o dono deste boteco recebeu um barril de uma deliciosa cachaça. Para facilitar a venda, engarrafou a cachaça em garrafas com diferentes rótulos Ora, os fregueses chegando ao balcão começaram a pedir a cachaça pelo rótulos das garrafas. E discutiam entre si dizendo: Nada se compara com a ‘Tatuzinho!’ ‘A 51 sem dúvida é a melhor!’ ‘A Ypioca é divinal!’. E brigavam entre si, batendo com as garrafas uns nas cabeças dos outros. Irritado com esta bagunça toda, eis o que disse o dono do boteco: ‘Já sei o que vou fazer!’ E naquela mesma noite tirou os rótulos de todas as garrafas. Desde então se fez paz naquele boteco. Os fregueses agora bebiam e elogiavam a mesma cachaça, esquecidos dos rótulos.5

O ecumenismo é uma caminhada lenta. Mas acontecerá sempre que esquecemos os rótulos que nós mesmos damos às pessoas. E assim nos relacionaremos uns com os outros, porque somos pessoas, filhos e filhas do mesmo Deus.

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Bibliografia consultada:

1. De Santana. Julio H. Ana. Ecumenismo e Libertação. Editora Vozes. Petropolis RJ. 1987. Pág. 15/17.

2. Sonho da Unidade: diferentes caminhos – círculos bíblicos. Série: A Palavra na Vida nº 117/118. Cebi: São Leopoldo. 1997. Pág: 15/16.

3. Idem. Página 6.

4. Armando. Dom Sebastião. Ide e Anunciai. Informativo Pastoral da Paróquia do Monte Carmelo. Ano I. nº IV. Maio de 1998.

5. Orofino, Francisco R. A cariciando o Sonho: Ecumenismo e Igrejas Cristãs. Série: A Palavra na Vida nº 122. Cebi. São Leopoldo. Página 7 e 44.

1 Comentário

  1. eu venho numa caminha de tentar viver o ecumenismo, e acredito claramente que é possível, mas precisa mudar a catequese, falo da igreja católica onde eu fiz minha catequese e foi ensinado pelo menos a mim que era a igreja de cristo. Agora eu tenho outra compreensão.

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